sexta-feira, 26 de outubro de 2007

O prazer de subir na vida

Matéria publicada no Jornal de Santa Catarina em 28/06/2005.

Com o objetivo de abrir uma rota de escalalada no Cerro Trinidad Sur organizamos o projeto "Conquistas na Patagônia". A equipe foi composta por min , Daniel Fernandes , o Montanhista Rian Muller e o documentarista Rafael Cassiano da Silva. Foram sete meses de correria para conseguir os patrocinadores , reunir o equipamento e adquirir o preparo técno e físico ideais.
Partimos no dia 27 de dezembro de 2004para San Carlos de Barriloche, na Argentina, para um periodo de aclimatação, escalando nas incriveis agulhas graniticas do Cerro Catedral, em meio ao clima nem sempre amistoso da Patagônia. Corpo e mente aclimatados, era a hora de nos preparar para as gigantes paredes de graníticas do Trinidad Sur no vale do rio Cochamo.
O vale do rio Cochamo esta ao sul do Chile, próximo a cidade de Puerto Mont. São muitas as montanhas de granito branco que nunca foram escaladas e podem chegar a mil metro. Tudo isso em meio a floretas milenáres de alerces.
Ali o acesso é bem complicado. Atravessar rios gelidos e de fortes corredeiras, caminhar por trilhas com muita lama e por terrenos nem sempre estavéis era algo rotineiro. Estavamos isolados com cerca de 200kg em equipamentos e suprimentos em meio a paredes que intimidavam.
Passamos 15 dias na região sendo 7 deles dedicados a escalada. Começavamos a escalar as 5h e na maioria dos dias paravamos a mea-noite. Os objetivos diários tinham que ser cumpridos. O maior medo era o mau tempo.
No sexto dia já exaustos, chegamos ao topo! Dia lindo muitas fotos , alegria geral , mas a escalada ainda não havia terminado! Não era possivel descer pela rota por onde subimos e tivemos que descer por outra. Tudo acabou bem e terminamos a conquista da via com 430m , intitulada "Vida de Ogro".

sábado, 13 de outubro de 2007

Dos Andes centrais à Patagônia em bicicleta





Com certeza não há um veículo que permita viajar tendo um contato tão grande com as pessoas e paisagem local como a bicicleta. Essa foi a principal razão que me levou a viajar de bicicleta 5400 KM , saindo de Cordoba-AR atravessando a cordilheira dos Andes e passando através das regiões dos lagos e vulcões Chilenos , pedalando pelas magnificas e intimidadoras paisagens Patagônicas até chegar à Ushuaia.

Tudo começou dia 13 de setembro de 2000 , após seis meses de planejamento e condicionamento físico , e é claro uma boa dose de entusiasmo após ler livros como " No guidão da liberdade " e " Atravessando fronteiras ". Estava eu saindo de Cordoba-AR para 3 meses e 25 dias de surpresas e incertezas sobre duas rodas. Fica difícil resumir toda a viagem em poucos parágrafos mas em cada um tentarei relatar algumas das varias situações vividas.

Com quase duas semanas de viagem de Cordoba à Mendonza passando pôr regiões pouco habitadas e paisagem semidesértica estava começando a subir a cordilheira. Saindo de Mendonza resolvi mudar meu trajeto e passar pela estrada de " Villavicencio " pôr ser mais selvagem e bonita. Ao chegar a cidade de " Uspallata" conheci dois ciclistas americanos , Brain e Emily , acampamos juntos e como íamos todos para Santiago-CL pedalamos juntos até o Parque do Aconcágua , onde acampamos próximo a lagoa Horcones aos pés do monte Aconcágua. O dia seguinte amanheceu horrível e tivemos uma difícil pedalada com ventos fortes , neve e muito frio. Neste trajeto conhecemos Eric , ciclista chileno que estava passando de carro pôr nos e nos convidou para dormirmos em sua casa , dizia ele possuir uma " casa de ciclistas"?!? Viajamos até Los Andes , cidade à 80 KM de Santiago onde Eric possuía um pequeno sitio na entrada da cidade voltado para a face sul do Aconcágua. Sua casa foi construída com a ajuda dos ciclistas que ali passaram . Recebendo ciclistas desde 86 já haviam passado centenas e de várias nacionalidades e estilos. Ali descobri que existia uma rede de " casas de ciclistas " pôr todo o mundo que alojam ciclistas viajantes. Fiz muitas amizades e passei momentos incríveis em sua casa , ao sair não tive palavras para agradece-lo.

Partindo de Los Andes passei rapidamente pela região central do Chile para curtir pôr mais tempo a paisagem e a hospitalidade tão famosas do sul chileno. Nesta região os percursos foram tranqüilos , com um clima levemente frio e com muitos lagos e pequenas cidades pelo caminho , não precisei preocupar-me muito com os suprimentos e lugares para dormir , as estradas eram tranqüilas e estavam razoavelmente boas. Apesar de toda essa comodidade foi um dos trajetos mais solitários da viagem.

Patagônia , com certeza a região mais incrível que conheci. A costa do pacifico com suas florestas magníficas e clima muito chuvoso e frio e as estepes com seus ventos desafiadores e paisagem desértica. Foi neste ambiente que conheci Lorenzo , ciclista vasco ( país Vasco Espanha ) que já estava pedalando há 3,5 anos , saindo de Seatlo USA já havia conhecido quase todos os países das América. Figura realmente diferente e nômade nato Lorenzo acompanhou me até Ushuaia. Enfrentamos ventos tão fortes que pôr dias não conseguíamos pedalar , pois o vento lateral nos derrubava da " bike ". Lembro-me de olhar para a estrada e ver pequenas pedras serem arrastadas pelo vento. Apesar de toda dificuldade o calor da hospitalidade da população local compensava , pôr vezes éramos recebidos como velhos amigos nas " haciendas de la Patagônia ". Ao chegar a cidade de calafate para visitar o glaciar " Perito Moreno " conhecemos Jun , ciclista japonês que juntou-se a nos. Estivemos também pôr 5 dias no parque " Torres del Paine " , caminhamos entre suas incríveis torres graníticas e lagos de coloração exuberante.

Chegamos a Ushuaia dia 23 de dezembro ao chegar conhecemos mais três ciclistas mexicanos que nos convidaram para passar a ceia de natal juntos. No dia 25 pedalamos os últimos quilômetros e chegamos a baía de " Lapataia " lugar mais ao sul possível de chegar em uma bicicleta , 1500 KM do polo sul , " FIM DO MUNDO ".

Big Wall na Serra dos Órgãos-RJ


A via Crazy Muzzungos esta na Pedra do Garrafão localizada no Parque Nacional Serra dos Órgãos em Terresópolis-RJ, dentro do chamado “Vale da morte”.No vale além de outras montanhas impressionantes está a Pedra do Sino com algumas das vias de big wall mais difíceis do Brasil! Esta via foi o primeiro big wall do vale, conquistado em 1983 por uma equipe de suíços, com 16 cordadas ( 600m ) graduada em 5 VI+ A2 D6 é famosa pela famigerada aproximação que é considerada por muitos como o big wall de mais difícil acesso do Brasil.

Ouvi mais detalhes desta via na temporada de 2004 quando estava em São Bento do Sapucaí-SP. Mas só fui repeti-la no inicio de Julho de 2007 quando estava na internet e li o e-mail do amigo de SP Bruno “Cabeção” para a lista do Hang On procurando o croqui da crazy, na hora enviei uma resposta perguntando se estavam precisando de mais um parceiro e dia 06/07 o Bruno me buscou na rodoviária, passamos em São Bento para buscar o Beto e partimos para Teresópolis. Depois de alojados no Albergue do Lord acertamos o transporte de ida e volta ao parque com a simpática Dona Ângela.

A aproximação começa pelo leito do rio Soberbo onde entramos dia 8 as 6 AM e iniciamos uma caminhada que poderia ser graduada pelos lances de boulder que não paravam de surgir, na maioria das vezes pedra molhada e musgo com as mochilas pesadas, eram de matar!! Em muitos lances não dava para cair, mas não faltaram quedas na água e no mato enroscado entre espinhos e cipós! Já no final do dia ficamos em duvida, pois tínhamos que encontrar um afluente à direita e uma “mega cachoeira” onde havia uma fita vermelha e uma corda fixa indicando sua subida pela direita, assim estava descrita no e-mail que a Kika tinha enviado ao Bruno, também encontramos um acampamento de caçador que foi descrito no e-mail e ai confundiu mais ainda!! Entramos em um vale errado e perdemos mais algumas horas! Resolvemos seguir mais pelo rio e acampar no melhor lugar possível. Pouco antes de anoitecer achei um totem de pedra em uma das passagens descritas no e-mail, estávamos no caminho certo!! As 12h do segundo dia chegamos no bivac próximo à base.

No primeiro dia de escalada subimos as três primeiras enfiadas em muitos furos de clif grandes e quebrados acabando num trepa mato bem pegajoso! O Cabeção guiou as duas primeiras, eu guiei a terceira eo Beto organizou o bivac e equipos que puxaríamos até a terceira base. Voltamos ao bivac nos alimentamos bem e dormimos cedo, pois as 2:30 da matina acordamos para iniciar o segundo dia de escalada.

Ainda totalmente escuro e com um céu incrivelmente estrelado esperava meus parceiros para guiar a quarta enfiada, eles se atrasaram um pouco com o haul bag enroscando em algumas coisas e às 7h estava guiando. As cordadas demoraram um pouco mais do que imaginamos e entre 5 + “forte” e A2 chegamos a P8 às 21h, com direito a “guiadinha” à noite que o Beto mandou muito bem. Ventava muito o céu estava bem estrelado e já tínhamos a incrível visão da Baia de Guanabara! Chegamos no platô que se revelou uma grande decepção por ser todo inclinado sem lugares bons para deitar, um lanche rápido e bora para os sacos de dormir, pois o vento estava pegando!!!

Guiei as duas cordadas depois do platô com o maior prazer, depois de três dias sem pegar sol foi muito bom esperar os parceiros pegando um sol! Essas enfiadas seguiam por fendas lindas e toda em livre!! Mais uma enfiada curta guiada pelo Beto e chagamos no ombro, uma caminhada cansativa neste grande platô até a base da P12. A neblina fechou completamente e já começava e chuviscar, caralho a ultima cordada sai em aderência! Encharcada seria impossível escalar! Bruno fixou duas cordadas depois do ombro e quando parou já estava tudo molhado. Descemos até o ombro onde comemos uma boa lentilha e tentamos dormir debaixo da chuva!

No sexto e ultimo dia o tempo ficou entre sol e nuvens, subimos os equipamentos até a P14 e como estava tudo molhado seguimos por uma canaleta de mato a direita que saiu em uma fenda com acesso fácil ao cume!! HUUUU finalmente, fotos, videozinho, beber uma aguinha das poças e se organizar para descer o dia estava só começando. Um rapel até o col entre o Garrafão e as encostas do sino, escalar na pedra molhada por um cabo de aço passar alguns buracos e chaminés e o mais difícil puxar o haul bag ! E quando eu pensei que ia aliviar uma caminhada nos costões que levam ao cume do Sino ao entardecer com neblina sabendo que estávamos entre paredes e vales gigantes a atenção foi total para não descer no local errado! Depois de subir o sino chegamos ao refugio 4 da trilha Tere-Petro onde se caminha mais 12km até a entrada do parque. Não tem moleza, esta ultima parte a galera caminhava no limite, “zumbi” caindo de sono! Chegamos a 1:30 da madrugada e a Dona Ângela foi nos resgatar na entrada do parque. Foi a escalada mais exigente fisicamente que já fiz! Alem de muita resistência é preciso experiência em orientação pois, não existem trilhas demarcadas e muita raça! Não é para playboy!